Responsáveis e co-responsáveis

No calor da derrota, a dirigente do Partido Socialista Ana Gomes acusou Manuel Alegre de ser "muito responsável" pela derrota da esquerda nas eleições presidenciais. A deputada ao Parlamento Europeu disse:
"Acho que Manuel Alegre, como um dos protagonistas da esquerda e como o candidato que corre à margem do partido e contra o candidato do partido naturalmente tem responsabilidades e não deve estar alegre neste momento". "Ele é co-responsável e muito responsável".
Faltou-lhe dizer, já que ele é o "co-", quem é o outro ou quem são os outros.
Não é a primeira vez que oiço esta senhora dizer asneiras.

Dos 8 830 706 portugueses que podiam votar, 8 052 317* (91,2%) são co-responsáveis por não votar no Soares, apoiado pelo Partido Socialista e pelo Sócrates — em minha opinião porque não quizeram; ninguém os obrigou a votar noutros, em branco, nulo ou abster-se.
Mas pelo raciocínio da deputada europeia Ana Gomes, apenas 778 389 portugueses (os que votaram no Soares) é que não são co-responsáveis pela derrota da esquerda. Ou seja, apenas esses 8,8% dos portugueses que podiam votar é que são bons cidadãos de esquerda! (para não dizer bons portugueses).


Já agora, dos 8 830 706 portugueses com direito a voto, também só 2 745 491 votaram no Cavaco Silva, o que dá apenas 31% [o resultado oficial, de acordo com o método oficial de contagem, foi 50,59%].
Os outros 6 085 215 portugueses (69%) ou abstiveram-se ou votaram em branco, nulo ou noutros candidatos.
O vencedor foi o Candidato Abstenção, com 3 301 589 "votos" (37,39%).


* - Resultados oficiais quando só faltava apurar duas freguesias.